
Cientistas acreditavam que antigos organismos chamados nectocaridídeos faziam parte do grupo de cefalópodes — que compreende polvos e lulas. No entanto, através de fósseis encontrados no norte da Groenlândia, pesquisadores descobriram que essas criaturas são descendentes de ‘verme-flecha’, animais marinhos conhecidos como quetognatos.
O estudo sobre as evidências encontradas foi feito por pesquisadores da Universidade de Bristol, na Inglaterra, e publicado na revista científica Science Advances no dia 23 de julho. Através das evidências, pesquisadores observaram que os ancestrais dos vermes-flecha tinham uma anatomia muito mais complexa e um papel mais predatório na cadeia alimentar em comparação com as lulas.
As expedições de escavação foram iniciadas há cerca de nove anos no Sirius Passet, área no norte da Groenlândia. A região é conhecida por conseguir preservar sítios arqueológicos, inclusive os fósseis de animais marinhos que viveram há mais de 500 milhões de anos, no período do Cambriano.
“Sirius Passet é um tesouro de fósseis da Explosão Cambriana. Não encontramos apenas fósseis delicados de corpo mole, mas também seus sistemas digestivo, musculatura e, às vezes, até mesmo seu sistema nervoso”, disse Jakob Vinther, coautor principal do estudo, em comunicado.
Uma pesquisa publicada há 15 anos afirmava que os fósseis dos nectocaridídeos — organismos aquáticos extintos muito parecidos com lulas — pertencia ao grupo dos cefalópodes. No entanto, Vinther acreditava que a hipótese não fazia sentido, pois a anatomia desses fósseis não tinham uma anatomia correspondente com a de cefalópodes.
Os fósseis de vermes-flecha foram nomeados Nektognathus evasmithae em homenagem a Eva Smith, defensora dos direitos humanos e professa de direito na Dinamarca. “Minha decisão de nomear nosso fóssil em homenagem a Eva foi porque esse animal era um lutador inteligente e furtivo, assim como ela”, explica Vinther.
Como aconteceu o estudo
Para realizar o estudo, a equipe coletou e analisou 25 espécimes de fósseis nectocaridídeos com até 518 milhões de anos idade, e identificou onde eles estavam encaixados na árvore filogenética — que mostra as relações de descendência entre os seres vivos. Tudo isso foi possível graças ao nível de preservação dos sistemas nervosos dos fósseis mantido pela reserva arqueológica no Sirius Passet.
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“Descobrimos que nossos nectocaridídeos preservam partes de seu sistema nervoso como estruturas mineralizadas pareadas, e isso foi uma indicação de onde esses animais se encaixam na árvore da vida”, explica Vinther. A equipe encontrou fósseis que pertenciam a outro ramo da árvore filogenética em Sirius Passet — eram animais nadadores conhecidos como vermes-flecha, classificados como quetognatas.
“Todos esses fósseis preservam uma característica única, distinta dos vermes-flecha, chamada gânglio ventral”, disse o coautor principal, Tae-Yoon Park. Na barriga dos vermes-flecha encontra-se o gânglio ventral que é uma grande quantidade de nervos — algo exclusivo desses animais. Essa anatomia inédita e exclusiva, às vezes, pode ser substituída por minerais de fosfato durante a decomposição dependendo das condições em que o animal foi preservado.
“Agora tínhamos uma prova cabal para resolver a controvérsia sobre os nectocaridídeos. Os nectocaridídeos compartilham diversas características com alguns dos outros fósseis que também pertencem à linhagem do verme-flecha. Muitas dessas características são superficialmente semelhantes às da lula e refletem adaptações simples a um modo de vida ativo de natação em invertebrados, assim como baleias e antigos répteis marinhos acabam se parecendo com peixes quando evoluem para esse modo de vida”, afirma Park.
A lista de características peculiares dos vermes-flecha vai além. “Os nectocaridídeos têm olhos com câmeras complexas, assim como os nossos. Os vermes-flecha dificilmente conseguem formar uma imagem; eles apenas podem calcular de forma aproximada de onde vem o brilho do Sol. Portanto, os ancestrais dos vermes-flecha eram predadores realmente complexos, assim como as lulas, que só evoluíram cerca de 400 milhões de anos depois”, acrescenta Vinther.
Com todas essas evidências, descobriram que os vermes-flecha ocupavam um lugar no topo da cadeia alimentar. Os fósseis encontrados eram maiores do que os animais marinhos ainda vivos. Seu tamanho, seu sistema de natação, olhos e antenas indicam que o animal era um ótimo predador no passado.
Além disso, os vermes-flecha são carnívoros. Foram encontrados no seu sistema digestivo algumas espécimes denominadas Isoxys, que possuíam uma cobertura rígida do corpo (carapaças) como de um artrópode e eram capazes de nadar.
(Por Tainá Rodrigues)