Alguns dos navios se encontram ainda em bom estado de preservação — Foto: LAD

No início de 2024, arqueólogos do Escritório Estadual de Preservação de Monumentos de Baden-Württemberg (LAD), na Alemanha, resolveram encabeçar um projeto ambicioso: documentar todos os naufrágios presentes nas profundezas do Lago de Constança. O lago alpino fica na tríplice fronteira com a Áustria e a Suíça, e é considerado um dos maiores da Europa.

O estudo marca a primeira investigação do local em busca de monumentos subaquáticos. E, agora, com 75% das atividades iniciais concluídas, a equipe anunciou, por meio de comunicado divulgado no dia 12 de agosto, a descoberta de 31 embarcações a até 251 metros abaixo da superfície – todas elas eram desconhecidas até então pelos especialistas.

Do romantismo à arqueologia

Como lembra o site Artnet, por muitos anos, o Lago de Constança foi conhecido por inspirar poetas românticos com sua paisagem deslumbrante Anos depois, a formação revela uma faceta menos contemplativa e mais histórica, já que suas águas guardam registros materiais de séculos de navegação, comércio e lazer. Veja vídeo produzido no local:

Projeto descobre 31 navios naufragados no mesmo lago

Até o fim de 2024, os pesquisadores já haviam identificado mais de 250 anomalias geográficas no fundo do lago, com base em dados topográficos coletados previamente pela agência ambiental do estado. Dessas, 186 foram examinadas com tecnologias de ponta, como sonar de varredura lateral, que cria imagens a partir de pulsos acústicos, e veículos robóticos submersíveis (ROVs).

O resultado da análise retornou com a constatação de que 155 locais se mostraram formações naturais ou de resíduos artificiais, enquanto em outros 31 casos foram confirmados naufrágios. As embarcações iam desde alguns exemplares modernos de recreio até navios históricos de grande valor cultural.

Achados que impressionam

Localizado em grandes profundidades, um veleiro cargueiro quase totalmente preservado mantém mastros, verga, braçadeiras da proa, pinos de amarração e até engrenagens com catraca. Devido à pouca incidência de mexilhões invasores em águas tão profundas, detalhes estruturais permanecem visíveis.

“Trata-se de uma raridade na arqueologia subaquática”, destacou a pesquisadora associada Alexandra Ulisch, no comunicado. “A descoberta oferece insights únicos sobre a tecnologia de navegação e a construção naval de navios históricos do Lago de Constança e representa um importante objeto de referência para pesquisa”.

Outro achado impressionante diz respeito a um campo de destroços com pelo menos 17 barris de madeira. Espalhados no fundo do lago, muitos deles ainda apresentam tampas e fundos intactos, e podem até conter marcas originais. O navio que os transportava ainda não foi identificado, mas novas investigações estão previstas.

Por fim, os cascos metálicos de dois navios a vapor com rodas de pás possivelmente representam os restos de SD Baden e SD Friedrichshafen II. O primeiro, lançado no século 19, foi o primeiro navio a vapor com salão de passageiros do lago e operou até 1930. O segundo, construído em 1909 e afundado na Segunda Guerra Mundial, homenageava a cidade de Friedrichshafen, famosa pela indústria naval.

Assista a um segundo vídeo gravado no local:

Arqueólogos resolveram documentar todos os naufrágios presentes no Lago de Constança

Metodologia pioneira

Segundo Julia Goldhammer, gerente do projeto, a combinção de mapeamento batimétrico, imagens de alta resolução e verificações direcionadas foi crucial para separar o que era natural do que era técnico. Sem essas técnicas pioneiras, o trabalho teria sido bem mais difícil.

“Os resultados demonstram a rlevância da abordagem metodológica”, destaca a especialista. “Só assim conseguimos distinguir com segurança estruturas naturais de objets históricos”.

Esse processo, ainda em andamento, está estabelecendo novos padrões para a arqueologia subaquática em lagos e rios. Vale lembrar que essas formações tradicionalmente são bem menos exploradas do que a arqueologia marítima.

Cápsulas do tempo submersas

Para Ulisch, cadanaufrágio é mais do que um simples acidente do passado. “Esses navios são verdadeiras cápsulas do tempo que preservam as histórias e o artesanato de épocas passadas”.

As descobertas não apenas resgatam memórias de viagens e transportes, mas também ajudam a reconstruir aspectos sociais e econômicos da região. Barris de madeira, por exemplo, podem revelar que tipo de mercadoria circulava pelo lago, de onde vinha e como era armazenada.

Os responsáveis esperam que os trabalhos no lago sejam estendidos até 2027, quando será publicado o inventário completo dos naufrágios. Até lá, novas descobertas devem surgir e revelar novos detalhes sobre a importância do Lago de Constança como centro de navegação histórica e patrimônio cultural submerso.

“Com esses estudos, não estamos apenas registrando navios perdidos”, observa Goldhammer. “Estamos reconstruindo modos de vida, redes comerciais e o cotidiano das sociedades que viveram ao redor deste lago ao longo dos séculos”.

Veja uma galeria de fotos capturadas nos mergulhos:

(Por Arthur Almeida)